Exposição Trabalhadores traz imagens para pensar o presente
- sarahvivian24
- 18 de set.
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A série fotográfica Trabalhadores, em exposição na Casa Firjan, se trata da primeira mostra póstuma do fotojornalista mineiro Sebastião Salgado, falecido em maio desse ano. Essa série documental registra uma diversidade de pessoas envolvidas em atividades laborais entre os anos de 1986 e 1992: Salgado retrata lavradoras da Bahia e Ruanda, mineradores da Índia, magarefes estadunidenses, trabalhadoras indianas, cubanas, ruandesas e russas, pescadores italianos, operários franceses e ingleses, entre outros.
Ao se analisar qualquer trabalho estético, é preciso se atentar a dois elementos: à sua forma e ao seu conteúdo. Quanto ao primeiro, o trabalho com fotografias em preto & branco, do qual Salgado é um dos principais expoentes, possui força devido à centralidade da silhueta, com ênfase em aspectos como o contraste entre luz e sombra, as linhas e a composição dos objetos. Posto isso, o conteúdo desse projeto é o ser humano, e o ser humano inserido primariamente no trabalho – o que não esgota a essência do tema tratado nem seus desdobramentos.

O fotógrafo busca mostrar, paradoxalmente, a contraposição e a simbiose que os humanos estabelecem inevitavelmente com o ambiente trabalhista; o quão proporcionalmente pequenos, na maioria dos casos retratados, seus corpos são perto das suas produções e da natureza; e do quão insalubres e excruciantes são as condições. Esse projeto foi realizado em um período de incerteza sobre o futuro do trabalho, visto que foi realizado nos anos finais da Guerra Fria e a queda da União Soviética e em um Brasil que ainda lida (ou deveria lidar) com seu passado escravocrata: os trabalhadores e seus direitos foram (e ainda são!) objeto de disputa.
A série fotográfica mostra trabalhadores de diferentes regiões do mundo – latino-americanos, europeus, americanos, asiáticos e africanos – e, por meio dela, é possível perceber a Divisão Internacional do Trabalho, em que países do Sul Global fornecem, majoritariamente, matérias-primas e cuja mão-de-obra é constituída por trabalho precarizado, explorado e mal remunerado, enquanto o Norte Global era constituído por trabalhadores com um acesso relativamente maior a direitos.
Além disso, essa mostra nos provoca questões sobre a alienação que temos em relação aos processos produtivos: dificilmente pensamos sobre as mãos envolvidas na produção dos artigos, estruturas, serviços e construções constituintes de nossa sociedade contemporânea. As fotografias consistem em uma reumanização do trabalho, uma tentativa de nos aproximar e sensibilizar com aqueles que constroem o mundo: a classe trabalhadora. De modo geral, a mostra também toca em relações de gênero e de raça, indissociáveis das questões econômicas – para se tratar dessas demandas sociopolíticas é preciso ter um viés interseccional.

Na maioria das fotos, os humanos foram colocados como objetos de observação; mesmo quando suas produções eram colocadas em perspectiva, eles aparecem como parte da composição artística. Posto isso, há duas fotos em que os trabalhadores não aparecem de maneira alguma e que gostaríamos de ressaltar: as que apresentam animais não-humanos, como os porcos e peixes. Estes também são massivamente explorados nos processos produtivos e tem suas experiências sencientes limitadas a processos de dor, privação e morte. Ao se falar de libertação da classe trabalhadora, também é possível e deve-se colocar em pauta a libertação de todos os explorados no atual sistema.
Como resultado, a exposição reflete o passado sob o viés da questão do trabalho e impõe indagações e reflexões sobre o presente dos trabalhadores, ainda mais quando pensamos sobre a atualidade e as querelas políticas sobre o tema. E, como eixo central, reafirma que o trabalho é humano, essencialmente humano.
Essa mostra ocorre até o dia 21 de setembro de 2025, na Casa Firjan em Botafogo e conta com 149 fotos do fotógrafo, com curadoria de Lélia Wanick Salgado.
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